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Resenha do livro: Uma igreja chamada TOV.

Mcknight, Scot & Barringer, Laura. Uma igreja chamada TOV – A formação de uma cultura de bondade que resiste a abusos de poder e promove cura. Editora Mundo Cristão. São Paulo, 2022, 267 p.

Igreja? Tô fora”. Este é o título de um livro muito interessante de autoria do Rev. Ricardo Agreste, pastor presbiteriano. Neste livro, Agreste apresenta uma reflexão muito qualificada a respeito do porquê as pessoas estão abandonando as igrejas nos dias de hoje, formando um exército de “desigrejados”, grupo tão discutido ultimamente.

A obra do Rev. Ricardo Agreste puxa a fila de tantas outras publicações sobre este mesmo assunto, todos apresentando argumentos e ponderações relevantes e que discutem tema tão urgente para a Igreja de Cristo no Brasil.

O livro “Uma igreja chamada tov” também trata o tema, no entanto, o faz a partir de uma perspectiva muito mais profunda e instigante: a discussão que parte de aspectos culturais enraizados nas nossas comunidades de fé, que ferem, maltratam e afastam as pessoas da igreja.

A partir da análise da palavra hebraica “tov”, traduzida como “bondade”, os autores advogam a necessidade de a igreja manifestar em seu ambiente justamente os valores da bondade de Deus, como uma manifestação natural da presença de Deus no meio do seu povo. No entanto, salientam os autores, nem sempre isso acontece.

Todos temos sido bombardeados com notícias terríveis associadas à Igreja de Cristo e aos seus líderes. Abusos de poder com o uso de violência verbal e institucional, escândalos sexuais, desvios de dinheiro em valores muito significativos, entre outros. E os autores argumentam que todos estes fatos desabonam a igreja e seguem na contramão da cultura de bondade que deveria prevalecer no ambiente eclesiástico.

Eleger e tratar adequadamente o tema da cultura institucional para as reflexões do funcionamento da igreja é um ponto alto do livro. Os autores assim justificam a necessidade de discuti-lo:

Formamos culturas eclesiásticas, mas ao mesmo tempo, somos formados pelas culturas que ajudamos a formar. É como o casamento. Case-se com alguém e, em pouco tempo, você e seu cônjuge começarão a moldar um ao outro. Essa dinâmica mútua de moldar e formar desenvolve uma cultura de amor. Essa cultura de amor, interesse e compromisso começa a moldar você e seu cônjuge, e assim por diante. Essa é uma dimensão daquilo que a Bíblia quer dizer quando afirma que “dois se tornam um”.

Infelizmente, o mesmo processo se aplica a um casamento infeliz; neste caso, porém, você e seu cônjuge moldam um ao outro de maneiras negativas. Em vez de formar uma cultura de amor, alguns casais formam uma cultura tóxica de tensão, crítica, evasivas, comunicação inadequada e comportamento passivo-agressivo.

Qualquer que seja o caso, sempre que pessoas se unem, a formação de uma cultura é inevitável. E essa cultura molda, inevitavelmente, todos que fazem parte dela. (p. 31)

Tudo o que ocorre nas nossas igrejas está envolvido com a cultura que temos desenvolvido. Se a cultura é “tov” (cultura da bondade, no sentido mais geral e abrangente do termo), o resultado é um; se a cultura é tóxica, marcada por truculência, mentiras e aparências, o resultado é muito diferente e altamente desfavorável à vida em comunidade, gerando muitos feridos e vítimas de relacionamentos muitas vezes abusivos.

A partir desta premissa, os autores passam a apresentar as características da cultura tóxica encontrada em muitas das nossas igrejas: o narcisismo de algumas lideranças (cujas atitudes revelam muito egoísmo e pouca empatia), o uso do poder eclesiástico sob a batuta da intimidação dos descontentes e críticos, a retaliação e a campanha de destruição da imagem daqueles que contestam, entre outras atitudes desastrosas para a vida comunitária.

O livro segue discorrendo a sua tese de que é necessário desenvolvermos uma cultura tov na igreja, apontando, por outro lado, sinais e evidências de uma comunidade doente e carente da cultura da bondade. Dentre estes fatores, os autores sinalizam como uma das evidências de uma cultura doente o aniquilamento da figura da mulher como protagonista no ambiente eclesiástico:

Como podemos formar uma cultura de tov em que mulheres (e outras pessoas) sejam honradas, valorizadas e tenham voz? O que podemos fazer para mudar a cultura androcêntrica e formar uma cultura mais equilibrada, em torno de homens e mulheres, que reflita uma cultura de tov à semelhança de Cristo? Nosso objetivo é ser uma igreja em que todos sejam igualmente valorizados como portadores da imagem divina, com dons e aptidões investidos de poder pelo Espírito Santo. Como podemos trabalhar para desenvolver esta cultura? (p. 121)

Exatamente neste ano de 2024, nossa Igreja Presbiteriana Independente do Brasil celebra o Jubileu de Prata, os 25 anos da ordenação feminina na nossa denominação. No último Congresso de pastores, ocorrido no mês de setembro de 2024, em São Carlos, mais de 500 pastores se reuniram e celebraram a bênção de sermos uma igreja que reconhece e proclama que Deus chamou homens e mulheres para o ministério, seja para o diaconato, o presbiterato ou o ministério pastoral. Neste sentido, utilizando a linguagem do livro, temos uma legislação tov. Mas a realidade das nossas igrejas tem, realmente, manifestado tov em relação ao ministério feminino? Seria verdadeiro afirmar que, no que diz respeito a este tema, o conceito tov, em muitos casos, tem ficado apenas na nossa legislação eclesiástica?

O livro “Uma igreja chamada TOV – A formação de uma cultura de bondade que resiste a abusos de poder e promove cura”, de Scot Mcknight e Laura Barringer, numa linguagem simples e clara, nos convida a repensarmos nossas relações eclesiásticas, nossa dinâmica comunitária e nos desafia a promover a uma cultura de bondade, empatia e inclusão em nossas comunidades de fé.

Trata-se de uma leitura muito oportuna a todos os cristãos, mas quase obrigatória para aqueles que ocupam posições de liderança na Igreja de Cristo, promovendo um debate que se faz necessário em nosso tempo

Assim, recomendo fortemente a leitura a todos aqueles que estão verdadeiramente preocupados com uma igreja que manifeste os sinais do reino de Deus, uma igreja tov.

 

Prof. Dr. Rev. Esny Cerene Soares

Coordenador de Pós-graduação, Pesquisa e Extensão da FATIPI

Pastor da Igreja Presbiteriana Independente de Vila dom Pedro I - São Paulo



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